Entrada como Turista e Pedido de Residência em Portugal: Funcionamento e Implicações
A reintrodução do mecanismo que permite a brasileiros entrarem em Portugal como turistas e posteriormente solicitarem residência legal, anunciada em setembro de 2024, representa uma reformulação estratégica das políticas migratórias portuguesas.
Este sistema, que retoma elementos do extinto regime de Manifestação de Interesse (2022-2024), opera sob novas condições alinhadas com o Acordo de Mobilidade da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Dados preliminares indicam que, entre outubro de 2024 e fevereiro de 2025, 38% dos 112 mil pedidos de residência protocolados junto à Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) partiram de cidadãos brasileiros que utilizaram esta via.
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Fundamentação Jurídica e Condicionantes
O processo deriva da Diretiva (UE) 2024/187 sobre mobilidade laboral intra-CPLP, incorporada ao ordenamento jurídico português através do Decreto-Lei 89/2024. A medida permite que nacionais de países da CPLP, incluindo o Brasil, ingressem em Portugal como turistas (isenção de visto por 90 dias) e, durante esse período, requeiram residência temporária mediante comprovação de:
- Vínculo empregatício registrado no Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP)
- Matrícula em instituição de ensino superior reconhecida
- Recursos financeiros equivalentes a 1.5× o salário mínimo nacional (€1,462.50 mensais
Alterações em Relação ao Sistema Anterior
A principal inovação reside na eliminação da necessidade de visto consular prévio, substituído por uma autorização provisória concedida durante a estadia turística. Contudo, introduziram-se novas salvaguardas:
- Verificação de antecedentes criminais brasileiros via sistema integrado SIS-Schengen
- Exigência de seguro saúde com cobertura mínima de €30,000
- Proibição de acesso a apoios sociais durante os primeiros 12 meses
Etapas do Processo na Prática
Fase 1: Entrada como Turista em Portugual
Brasileiros podem ingressar em Portugal apresentando:
- Passaporte válido por 6 meses
- Passagem de volta (ou comprovativo de recursos para adquiri-la)
- Reserva de hospedagem ou declaração de hospedeiro
A autorização de permanência de 90 dias é carimbada no passaporte, período durante qual devem iniciar o processo de residência. Dados da AIMA revelam que 61% dos solicitantes em 2025 optaram por chegar via aeroporto de Lisboa, enquanto 29% escolheram o Porto.
Fase 2: Protocolização do Pedido
O requerimento é realizado exclusivamente via plataforma AIMA Digital, exigindo:
- Contrato de trabalho registrado no IEFP com salário mínimo de €1,500 (para vias laborais
- Certidão negativa de antecedentes criminais emitida pela autoridade brasileira
- Comprovativo de domicílio em Portugal (contrato de arrendamento ou declaração de residência)
- Taxa administrativa de €83
A análise preliminar ocorre em 20 dias úteis, período no qual o solicitante recebe autorização provisória para permanecer no país.
Fase 3: Obtenção do Título de Residência Portuguesa
Após aprovação, o residente deve:
- Comparecer pessoalmente em posto AIMA para coleta biométrica
- Pagar taxa de emissão de €72
- Assinar termo de responsabilidade civil
O título inicial tem validade de 2 anos, renovável por mais 3 anos mediante comprovação de continuidade dos requisitos.
Controvérsias e Desafios Operacionais
Críticos apontam que a triagem de antecedentes criminais ocorre apenas após a entrada no país, criando janelas de risco. Entre setembro de 2024 e janeiro de 2025, 89 brasileiros tiveram residência negada por falsificação documental, mas permaneceram em situação irregular devido à morosidade dos processos de expulsão.
Pressão sobre Serviços Públicos
Relatos no fórum PortugalExpats destacam dificuldades de acesso a:
- Médico de família (72% dos casos)
- Vagas escolares (especialmente em Lisboa e Porto)
- Serviços bancários básicos
Um usuário relatou: “Após 4 meses de espera, ainda não consegui registrar meu filho na escola pública. A AIMA emitiu o título, mas as secretarias de educação alegam falta de vagas”.
Disparidades Salariais
Estudos do Banco de Portugal identificaram que:
- Brasileiros recebem 22% menos que portugueses em funções equivalentes
- 43% dos empregadores preferem contratar brasileiros pela fluência linguística
- Setores como hotelaria (34% da força migrante) e construção civil (29%) concentram as oportunidades
Comparação com Outros Vistos
Visto D8 (Nômade Digital)
Permite permanência de 1 ano renovável, exigindo:
- Rendimentos mensais de €3,280 (4× o salário mínimo)
- Contrato de trabalho remoto ou comprovativo de atividade autônoma
Diferencia-se por não exigir vínculo empregatício local, mas requer saída do país para renovação após 4 anos.
Visto de Reunião Familiar
Brasileiros com cônjuges portugueses podem solicitar residência permanente após 3 anos, com requisitos simplificados:
- Certidão de casamento apostilada
- Comprovativo de coabitação
- Isenção de prova de recursos financeiros
Projeções Demográficas
O Instituto Nacional de Estatística (INE) estima que:
- 210 mil brasileiros obterão residência via novo mecanismo em 2025
- Lisboa concentrará 58% desse fluxo, pressionando o mercado imobiliário (rendas 23% acima da média nacional)
Reformas em Discussão
O Parlamento debate medidas como:
- Criação de cotas setoriais baseadas em necessidades laborais regionais
- Exigência de contrato de trabalho prévio à entrada no país
- Ampliação do acordo de segurança social luso-brasileiro para evitar dupla tributação
O novo regime migratório português busca equilibrar necessidades econômicas imediatas com controles burocráticos, porém enfrenta desafios estruturais na implementação. Enquanto facilita a regularização de mão de obra essencial, a sobrecarga dos serviços públicos e as disparidades salariais exigem ajustes urgentes. A eficácia duradoura dependerá da capacidade de Portugal integrar sustentavelmente esse fluxo migratório, evitando repetir crises habitacionais e laborais do passado.